Comentário de Questão - Regime Jurídico das Contratações Temporárias

FUNDEP | 2019 | Promotor de Justiça (MPE MG)/LVII

O Supremo Tribunal Federal, no leading case referente a contratações temporárias (RE 658026/MG), elencou requisitos de validade da contratação temporária, indicando expressamente:

a) apenas a previsão em lei, a determinabilidade temporal do vínculo jurídico estabelecido entre poder público e contratado, e a excepcionalidade de situação fática atípica, na Administração Pública, ensejadora de risco ao princípio da continuidade do serviço público.

b) apenas a previsão em lei, o prazo de contratação predeterminado, a necessidade temporária, o interesse público excepcional, e a necessidade de contratação indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração.

c) apenas a temporariedade do vínculo jurídico firmado, a previsão em lei, e o excepcional interesse público, consubstanciado na situação fática anômala ocorrida na Administração Pública, ensejadora de risco ao princípio da continuidade do serviço público.

d) apenas o prazo de contratação predeterminado, a necessidade temporária, o interesse público excepcional, e a necessidade de contratação indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração.


Comentários

Esta questão de múltipla escolha aborda um dos temas mais sensíveis e frequentemente cobrados no Direito Administrativo: o regime jurídico especial de contratação por tempo determinado. Trata-se da exceção constitucional à regra do concurso público, e o Supremo Tribunal Federal (STF) tem papel crucial na delimitação estrita de sua validade, exatamente para impedir o desvio de finalidade e a burla à exigência de ingresso por concurso.

Vamos desdobrar o tema para garantir a compreensão integral do gabarito e de todas as "pegadinhas" que a banca tentou explorar.


1. Enquadramento Temático

Esta questão versa sobre os requisitos de validade e o regime jurídico das contratações temporárias (servidores temporários), com base no art. 37, IX, da Constituição Federal, e na jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (STF).

2. A Aula - O Núcleo do Tema

A regra geral para o ingresso no serviço público é a aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos. Contudo, a própria Constituição Federal prevê uma exceção no art. 37, IX:

“a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

O grande desafio judicial e doutrinário é definir o que constitui "necessidade temporária" e "excepcional interesse público", para evitar que essa exceção se torne a regra, permitindo a contratação de pessoal para atividades permanentes e ordinárias do Estado.

Fundamento e Requisitos de Validade (O Entendimento do STF)

O STF, por meio de sua jurisprudência (como no caso paradigmático mencionado, RE 658026/MG), estabeleceu uma série de requisitos cumulativos e estritos para que a contratação temporária seja considerada constitucional e válida. Esses requisitos buscam garantir a restritividade da exceção e coibir a precarização das relações de trabalho no setor público, especialmente em casos de prorrogações sucessivas de contratos de trabalho temporários.

Os pilares que sustentam a validade da contratação temporária são:

  1. Previsão em Lei Específica: Os casos excepcionais de contratação devem estar expressamente previstos em lei.
  2. Prazo de Contratação Previamente Determinado: O vínculo deve ter determinabilidade temporal.
  3. Necessidade Temporária (da função): A natureza da necessidade que gera a contratação deve ser transitória, passageira.
  4. Excepcional Interesse Público: A situação deve ser anômala, inesperada ou urgente, fugindo das contingências normais da Administração.
  5. Contratação Indispensável: Deve ser demonstrado que a contratação é a única solução viável para o momento.

O ponto de maior atenção, e que demarca o limite do constitucionalmente aceitável, é a vedação expressa de se utilizar esta modalidade para prover o que o STF chama de serviços ordinários permanentes do Estado, ou seja, aquelas atividades que deveriam estar sob o espectro das contingências normais da Administração e, portanto, ser ocupadas por servidores concursados.


3. Análise Detalhada da Questão

A questão busca o elenco completo dos requisitos definidos pela Suprema Corte.

Alternativa (a)

apenas a previsão em lei, a determinabilidade temporal do vínculo jurídico estabelecido entre poder público e contratado, e a excepcionalidade de situação fática atípica, na Administração Pública, ensejadora de risco ao princípio da continuidade do serviço público.

Análise: INCORRETA. Embora mencione elementos essenciais como a previsão em lei e a determinabilidade temporal (prazo predeterminado), esta alternativa é incompleta. Ela omite a exigência de que a contratação deve ser indispensável e, crucialmente, não estabelece a vedação de contratar para serviços ordinários permanentes.

Alternativa (b)

apenas a previsão em lei, o prazo de contratação predeterminado, a necessidade temporária, o interesse público excepcional, e a necessidade de contratação indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração.

Análise: CORRETA. Esta alternativa apresenta a lista completa e mais restritiva dos requisitos de validade, conforme o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, que transforma a previsão constitucional genérica (necessidade temporária de excepcional interesse público) em um rol de critérios objetivos. O grande diferencial é a menção à vedação de contratação para serviços ordinários permanentes, o que impede o desvio de finalidade frequentemente combatido pelo STF.

Alternativa (c)

apenas a temporariedade do vínculo jurídico firmado, a previsão em lei, e o excepcional interesse público, consubstanciado na situação fática anômala ocorrida na Administração Pública, ensejadora de risco ao princípio da continuidade do serviço público.

Análise: INCORRETA. Esta opção também é incompleta e imprecisa. Ela não exige o prazo predeterminado nem a indispensabilidade da contratação, e falha ao não mencionar a vedação para os serviços permanentes e ordinários. A jurisprudência exige a conjunção de requisitos, e a omissão de um deles torna o ato administrativo inválido.

Alternativa (d)

apenas o prazo de contratação predeterminado, a necessidade temporária, o interesse público excepcional, e a necessidade de contratação indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e que devam estar sob o espectro das contingências normais da Administração.

Análise: INCORRETA. Embora liste quase todos os requisitos de conteúdo material e a vedação essencial, esta alternativa omite a exigência formal de previsão em lei, fundamental para a legalidade do ato (princípio da legalidade estrita, que rege a Administração Pública). Sem a lei autorizativa, o ato é nulo, independentemente da excepcionalidade da situação.


4. Ponto de Atenção (A "Pegadinha" da Banca)

A principal "pegadinha" neste tipo de questão é a tentativa de confundir os elementos contidos no texto constitucional (Art. 37, IX: necessidade temporária e excepcional interesse público) com os critérios mais rígidos e completos estabelecidos pela jurisprudência (que incluem a previsão legal, o prazo predeterminado, a indispensabilidade e, principalmente, a vedação para atividades permanentes).

Muitas vezes, as bancas apresentam alternativas que contêm apenas os requisitos do texto da CF, ignorando o filtro rigoroso imposto pelo STF para proteger o princípio do concurso público. A alternativa correta (b) é a única que engloba a rigidez da interpretação judicial.

5. Resumo Final (Caixa de Memorização)

A contratação temporária no setor público é uma exceção ao concurso público e deve ser regida por um regime jurídico especial, exigindo-se:

  • Previsão em Lei
  • Prazo predeterminado
  • Natureza Temporária da Necessidade
  • Excepcionalidade do Interesse Público
  • Contratação Indispensável
  • Veda-se a contratação para serviços permanentes e ordinários.

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